Saio de casa...não me lembro de como desci as escadas mas sei que o barulho das duas habituais voltas com a chave para trancar a porta me feriram levemente os ouvidos. Chego à porta do prédio e a luz resplandece através dos vidros... saio...Como as cores da rua são claras, há quanto tempo as não via e que saudades Deus meu! (momento de plágio do dia). Adoro Luz (e árvores!)mas a luz nos olhos que faz doer, não a luz na cara. Quer dizer gosto da luz na cara desde que não esteja ninguém ao pé de mim. Não olho para a calçada, só para a frente e para cima, para o céu. Atravesso o parque. Quem olha para mim deve ver-me andar aos ziguezagues. A árvore do meio já está tão nua! E tem pintassilgos empoleirados nos seus raminhos. Só agora me apercebo que já é Inverno! Perdi assim tanto tempo? As cores são diferentes, hoje. O céu está baço e lindo, tudo parece uma pintura em sfumato. Gosto de lamber a boca, como a Björk. Não que eu queira ser como a Björk, não tenho motivos para querer ser com a Björk ... porque haveria de querer ser como a Björk? Ora essa, tolice! Gosto de lamber a boca porque já gostava, antes de saber que a Björk também o fazia, claro! (ai, só eu e as paredes é que sabem!...) Chego ao outro lado da rua, não reparo na cara do condutor que parou na passadeira. Desconfio que nem reparei se algum carro parou na passadeira. Agora sim olho a calçada. Deste lado é mais clara, combina com o dia. Novamente as árvores estão nuas. Ah mas aquela não, e mais parece uma floresta de kelp! (Ok, algologia destruiu-me o teco). Tem umas vagenzinhas bordô. Muitas, comparada com as outras nuas. Prossigo embrenhada naquele semi-nevoeiro matinal. O rio. Hoje não é o rio sujo. É quase um rio de águas cristalinas. Quase uma pista de gelo. Como um espelho quieto. Quase posso patinar nele... Pronto, agora aqui à frente já se vê outra vez que é um rio sujo. Ah, chego aquele rés-do-chão. Hoje já está a roupa estendida. Não está lá o preto a estender a roupa cá fora. Ele deve ajudar a mulher, é tão engraçado. Costumo vê-lo de manhã a estender roupa com a particularidade de ele ter de sair de casa para vir estender a roupa na rua! Isso é giro. Se eu vivesse num rés-do-chão talvez já me tivesse apercebido que o Inverno tinha chegado! Passo agora por um caminho de quase todos os dias, de terra e estreito, ladeado por belas ervas rasteiras e cócós de cão (e talvez de humano, para ser correcta). Ah agora vejo a alfazema na borda da rotunda, mas hoje não apanho um bocadinho. A bomba de gasolina ainda não abriu. Ramos Catarino é a empresa encarregada da obra. Claro... o nome Catarino (a) é omnipresente (e potente!). Agora começo a subir a rampa que também é ponte, e o quadro muda um bocado. Há um cheiro esquisito, que deve vir ali do lado esquerdo da lavagem automática de carros. Novamente, o céu. Amplo mas desfocado envolvendo a cidade. Por momentos o nevoeiro parece-me uma pesada poluição. Mas rapidamente o meu idealismo do dia faz esquecer a hipótese. Noto que hoje me esqueci de dar as habituais duas voltas na camisola de gola alta, e dou. As camisolas de gola alta foram feitas para pescoçudos. Vem um homem gordo e com um saco preto sobre o ombro esquerdo (o meu lado esquerdo). Conforme se aproxima constato que é um cigano. Quase perto de mim ele pára, olha do alto da ponte e cospe para o rio lá em baixo. Não fico com muito nojo mas quando olho lá para baixo e vejo a água com aspecto sujo fico um bocado incomodada. Mais à frente no caminho está uma rapariga, da qual não recordo nada. Passo para o outro lado da estrada. Estou num passeio estreito de onde sinto o vento dos carros a passar e do meu lado direito tenho paredes sujas e pretas. Imediatamente à minha frente está uma preta empurrando freneticamente um carrinho de bebé. Ela não tem praticamente cabelo, está muito muito curtinho, mas mesmo assim vê-se que é carapinha. Traz umas calças brancas que estalam naquele cenário sujo e escuro. Por baixo tem umas cuecas ou vermelhas ou rosa, não percebo muito bem, mas que se notam perfeitamente por baixo das calças. Fico quase enconstada a ela a olhar para o rabo a ver se percebo de que cor é que são afinal as cuecas. Apercebo-me que é melhor tirar dali os olhos porque pareceria estranho às pessoas que vêm na direcção oposta. Iam ver um bébé num carrinho, atrás uma senhora a empurrá-lo e atrás dela uma miúda a avaliar-lhe o rabo. Não era uma quadro muito bonito. Continuo e só quando chego perto da entrada do metro, ao pé das cascas de laranja, é que penso, vou pôr isto no blog. Como é habitual há senhora a vender botinhas de criança e camisolas de gola alta à entrada do metro. Hoje não está lá a que vende as botas, ontem lembrei-me dela e achei que devia ter comprado um par que lá estava a semana passada. Entro na estação e compro um bilhete de ida e volta. Faço parte dos 5% de pessoas que sobem as escadas do metro a pé. Vejo uma senhora de terceira idade (este nome é feio) quase a a terminar a subida, no topo das escadas. A minha experiência a subir escadas de metro diz-me que dos 5% talvez a maioria sejam velhinhos que sobem as escadas do metro a pé. Isso é bonito! Sento-me à espera. Passa uma senhora baixa mas com botas altas e aspecto seguro, mas reparo que tem uma estranha mancha na narina esquerda (a dela e a minha). Porque é que há gajos que usam as calças apertadinhas? Para se ver o cú? Aquilo até os deve magoar. Gosto mais dos que usam calças largas as calças apertadas no rabo não ficam bem... ah pera, mas àquele ficam...hum nice! Ah é pena fumar!... O metro chegou. Entro. A senhora que subiu as escadas senta-se. Eu fico de pé perto dela. Quando for mais velha quero ser assim, continuar a subir escadas com a força dela, usar batôn e pôr-me arranjadinha como ela. Cheira pum, que mal! Não fui eu, a sério! Se calhar até foi a velhinha! Ponho-me a tentar fazer a ridícula estatística de quantos africanos existem na carruagem, mas desisto. Numa paragem qualquer entra um rapaz enigmático. O cabelo é bom de mau e tem a cara gira. Vêm colocar-se estranhamente perto de mim. Eu até gosto, sinto-me mais ou menos aconchegada. Ele cheira...cheira...ao Eduardo. Epá ele faz-me lembrar o Eduardo, é isso, o Eduardo. Ah mas desta vez não o vou deixar fugir (ou vou?) Epá que cheiro, é mesmo o Eduardo! Que momento bizarro. Sinto-me ligeiramente desconfortável porque está demasiado próximo, ou então sou eu a fazer filmes porque está muita luz no metro para eu estar perto de alguém. De qualquer das maneiras se vivesse no planeta Marte era bem capaz de me deixar descair como quem não quer a coisa para os braços dele e ficar naquela bizarria hipnotizante. Saio do metro e imagino que ele possa ter olhado para o meu rabo, ficando desiludido (:D). E logo hoje que estou tão encolhida! As escadas rolantes deste lado estão em manutenção. Dou a volta e dirijo-me para as outras escadas. Quase bato numa senhora. Mais uma vez declaro para mim própria que o metro é um local lindo para uma filmagem, cheio de poesia feita de imagens. Muitas vezes imagino que alguém dentro do metro em andamento olha para mim na estação e me deseja. E fica assim a olhar para mim e a ir embora. E eu sinto-me especial! Sim, definitivamente o metro é um local cheio de perspectivas fantásticas. Saio para a rua. Com sempre uma rapariga distribui uns papéis laranja à saída. Atravesso a passadeira, o cabrão do taxista quase parece que me vai atropelar. Vejo uns miúdos ao fundo, com as malas às costas, parece que estão a fazer um comício, que giros! Dobro a esquina e penso que só tenho estado atenta a pessoas e que não pode ser. Tento observar outras coisas. Ok, do lado esquerdo tenho o bingo do Sporting, por isso não. Em cima passa a 2ª circular, que tem a sua beleza mas não hoje particularmente... Ah, o semáforo verde, fixe! Passam agora dois corredores de calças bem justinhas men, de licra!Epá mas estas ficam mesmo muita bem! O atleta preto olha para mim, há uma fracção de segundo em que o tempo parece que pára... ai tinha cá umas pernas ... mesmo de atleta, com músculos definidos....hum...! Ok, com isto desisto de dedicar atenção a coisas.Prefiro observar pessoas, afinal ultimamente só me tenho visto a mim e a seres com os quais tenho consaguinidade (excepto a namorada do meu irmão e os meus piriquitos). Preciso de pessoas, sozinhos não somos ninguém. Pronto, e com o deslumbramento pelos atletas o semáforo fechou e agora tenho de esperar. Ultimamente tenho o hábito de não ficar parada à espera que o semáforo abra. Começo andar às voltas para trás e para a frente e gosto de ver a cara das pessoas, alguns com aquele olhar "o que tu queres sei eu!" e eu imagino-me a responder : " pois é, queria umas massagens!" Entro agora na parte que mais gosto dos meus dias de faculdade, ou seja na parte que mais gosto da maioria dos meus dias: árvores. Do lado esquerdo e direito: árvores! Árvores dentro do Museu da Cidade, árvores em frente ao Museu da Cidade, àrvores no jardim do Museu da Cidade, àrvores entre o Museu da Cidade e o jardim do Campo Grande, àrvores no jardim do Campo Grande, àrvores em frente à estátua do Peixoto. Àrvores a fazerem sexo como sol. Inicio, depois do êxtase com as árvores, o belo do pisoteio das gramíneas do relvado do C8. Faço corta mato porque como adverte um amigo de uma amiga minha a hipotenusa é menor que a soma dos catetos. Atravesso a faculdade em direcção ao c2. Dentro do c1 caio na realidade e começo a ficar nervosa com aquilo que até aqui tinha evitado pensar. Se o prof de Algologia chegou antes de mim, saberá que estou a entregar o exame depois do prazo e pode anular este conjunto de papéis que tão "sofridamente" me custaram a escrever (e que me privaram tantas horas de ver pessoas!) Aproximo-me da porta de abertura automática do c2. Quem será que vou encontrar? Amigos? Quais? (e o professor Pena, e se encontras o professor?...) Ok, estou no topo do corredor, os correios dos profs ficam lá ao fundo. Ao longe vejo um homem --> o professor? - Não. Vê-se logo pelo rabo ... e pelas costas!:). Chego à caixa do correio, o nervosismo acelerou ... AH! O prof ainda não tinha vindo buscar os exames! Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Safei-me!!!!! :) Sou a pessoa mais feliz do mundo!!! Ok, sem exageros a mais feliz de Odivelas! Err... do meu prédio? Andar?.... Não interessa! Fico com um sorriso na cara a puxar para a gargalhada e apetece-me dar um pulo! e dou por dentro, se calhar até dei por fora e nem me apercebi! Dirijo-me para a sala de computadores e começo a escrever esta verborreia mental! Já estou nisto há duas horas e nunca pensei que ainda tinha cabeça para o fazer!
Para acabar em beleza, o meu leitor de mp3 não teria as pilhas gastas e eu podia ir para casa a ouvir Radiohead e Nat King Cole.
:)
2 comentários:
:)
Epah, este post és mesmo tu!
Soube bem ler, até certa parte, lol. Tu, ai tu rapariga. Fazes muito bem em libertar a cabeça! Vê o mundo, examina as pessoas, ouve o silencio e o rio a correr. Faz percepções da vida e salta!!! Por dentro, por fora, faz como quizeres mas nunca percas essa alegria que nós todos tanto adoramos.
Já nem precisas de responder à minha sms, já vi aqui a minha resposta... Tontinha. Mas o que vale é que nasceste com esse rabo (apertado, como dizes :p) virado para a lua!!! Ai sortuuda!!!
Vamos lá ver pessoas, da uma apitadela para sairmos ***
Ahhh Pena! Nem sabes o bem que me fez ler este post depois de ter passado os ultimos dias apenas a ver numeros e probabilidades e integrais e variáveis e distribuições e ...
Soube mesmo bem! E fizeste-me recordar algumas coisas que vivo no dia a dia... Como a entrada do metro e da senhora que costuma lá estar a vendar as tais botinhas para as crianças e as cascas de laranja que todo o santo dia estão no mesmo sitio de manhã e já lá não estão à noite... ainda gostava de saber quem é a pessoa que todas as manhãs come uma laranja de manhã à porta do metro!!
E o bingo... e as escadas do metro... e a estátua e as árvores... e grande sorte que o prof ainda não tenha ido lá buscar os exames!!!!
E descreveste uma coisa que eu adro fazer: observar as pessoas! Deliro com isso.
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